Que o governo federal
abandonou os brasileiros à própria sorte durante a pandemia não é nenhuma
novidade. Quando confrontado com o número vergonhoso de vítimas fatais da
Covid-19, o presidente respondeu: “e daí?” Mesmo diante desse descaso, é
chocante acompanhar o comportamento doloso que se observa nas mais altas
esferas do poder público. Qualquer ser humano decente poderia supor que o
ministério da Saúde priorizaria o Programa Nacional de Imunizações (PNI) nesse
momento, responsável pelo controle das doenças no Brasil. É o contrário: o
ministério da Saúde abandonou o órgão. Mais uma vez, o governo federal age
contra os brasileiros.
Antes da Covid-19, o PNI
costumava distribuir 300 milhões de doses de vacina anualmente, o que tornou o
Brasil uma referência mundial no assunto. Pois o órgão está sem coordenação
desde 7 de julho, quando a diretora Franciele Fontana deixou o cargo. O
pediatra Ricardo Gurgel chegou a ser nomeado em 7 de outubro, mas seu
posicionamento favorável às vacinas impediu sua posse. É preciso prestar
atenção ao fundo do poço em que o Brasil chegou: um médico não pode assumir o
Programa Nacional de Imunizações porque é favorável às vacinas. Haverá no mundo
outro médico de verdade contrário às vacinas – o ministro Marcelo Queiroga já
mostrou não ser sério há muito tempo.
Ser contra as vacinas parece
ser a condição para assumir o tal cargo, e é provável que essa seja a razão que
explique por que o PNI está sem chefe há mais de cinco meses. O Brasil vive uma
pandemia que já matou 620 mil brasileiros e não tem sequer alguém para
coordenar a área responsável pela vacinação. A situação é inacreditável. O
descaso resvala em outras doenças cuja imunização é necessária. Segundo dados
do próprio Ministério da Saúde (DataSUS), em 2015 o País tinha uma cobertura
vacinal de 97%, atendendo doenças como tuberculose, poliomielite, rotavírus,
pentavelente, pneumonia, meningite, tríplice viral D1, hepatite A e hepatite B.
Em 2020, esse número caiu para 75%.
O sucesso das campanhas de
vacinação contra a varíola nos anos 1960 mostrou que a imunização em massa
poderia erradicar a doença – o último caso registrado no Brasil ocorreu em
1971. Em 1975 foi criado o PNI, com o objetivo de coordenar as ações de
imunização e otimizar os recursos e logística. Hoje, 48 anos depois, o órgão
não tem sequer um diretor – na emergência sanitária mais grave da história do
País. O descaso com o PNI e a incompetência criminosa do ministro Marcelo
Queiroga mostra apenas que a Saúde é mais uma área importante do Brasil que o
governo de Jair Bolsonaro está conseguindo destruir.
*IstoÉ
Segunda-feira, 27 de dezembro
2021 às 13:16